terça-feira, 7 de agosto de 2018

Cântico do Irmão Sol

   Os PP.  de Quaracchi, restringindo a sua edição dos escritos de São Francisco exclusivamente aos textos em língua latina, não o incluíram no seu opúsculo, sem, entretanto, por em dúvida a autenticidade do Cântico; demais, historiadores de nota, como Boehmer, Goetz, Bracaloni, além de Sabatier, reputam-no indubitavelmente da autoria do Santo. Sob a fé dessas autoridades o publicamos.
   É a joia da poesia franciscana. Nestes versos transborda a vida, a perpetua juventude, a beleza gloriosa da natureza que canta hinos ao Ser supremo e a Fraternidade universal. É ainda uma das mais formosas preces da criatura ao seu Senhor; e exemplifica otimamente esse método de oração mental - tão preconizado pela escola de São Vítor - pelo qual nos elevamos da contemplação das criaturas à do Criador e agradecemos a este pela beleza, pela bondade, pela utilidade que auferimos daquelas.
   Note-se ainda que São Francisco compôs este Cântico, enquanto jazia enfermo, quase cego e com grandes dores, numa palhoça perto de S. Damião, no inverno de 1225, dois anos antes da sua gloriosa morte. É particularmente característico este traço do espírito do seráfico Pai, que nem mesmo nos transes mais agros da sua vida deixava de louvar e cantar ao seu Senhor, "jogral de Deus" que se declara. Se ele é chamado "Santo alegre" por excelência, merece-o deveras, e, se aos seus Irmãos tanto recomendava a "alegria perfeita" que nem pela dor e tribulação é vencida ou turvada, ele mesmo dava o exemplo e a tinha e manifestava em grau admirável e heroico.
   Enquanto nos seus demais escritos São Francisco usava a língua latina, compôs, ele, todavia, o "Cântico do Irmão Sol" na melodiosa linguagem da sua terra.

O CÂNTICO DO SOL

Altíssimo, onipotente, bom Senhor,
Teus são o louvor, a glória, a honra 
E toda a benção.

Só a Ti, Altíssimo, são devidos;
E homem algum é digno
De Te mencionar.

Louvado sejas, meu Senhor,
Com todas as Tuas criaturas,
Especialmente o senhor Irmão Sol
Que clareia o dia
E com sua luz nos alumia.

E ele é belo e radiante
Com grande esplendor:
De Ti, Altíssimo, é a imagem.

Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irmã lua e as estrelas
Que no céu formaste claras 
E preciosas e belas.

Louvado sejas, meu Senhor, 
Pelo Irmão vento,
Pelo ar, ou nublado
Ou sereno, e todo o tempo
Por que as Tuas criaturas dás sustento.

Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irmã água
Que é mui útil e humilde
E preciosa e casta.

Louvado sejas, meu Senhor,
Pelo irmão fogo
Pelo qual iluminas a noite.
E ele é belo e jucundo
E vigoroso e forte.

Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irmã a mãe terra
Que nos sustenta e governa,
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.

Louvado sejas, meu Senhor,
Pelos que perdoam por Teu amor,
E suportam enfermidades e tribulações.
Bem-aventurados os que sustentam a paz.

Louvado sejas, meu Senhor,
Que por Ti, Altíssimo, serão coroados.
Por nossa Irmã, a morte corporal
Da qual homem algum pode escapar.

Ai dos que morrerem em pecado mortal!
Felizes os que ela achar
Conformes à Tua santíssima vontade,
Porque a morte segunda lhes não fará mal!


Louvai e bendizei a meu Senhor,
E dai-Lhe graças
E servi-O com grande humildade.


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